A Breve História do CD SMD
Uma Inovação Brasileira Contra a Pirataria que o Tempo Não Esperou
Fala Disconector!
Você já ouviu falar do CD SMD? Talvez esse nome nem te soe familiar… e olha, não te julgo. Essa é daquelas histórias tão bizarras e ao mesmo tempo geniais que só poderiam ter acontecido no Brasil. E, claro, sumiu tão rápido quanto apareceu.
No começo dos anos 2000, bem no auge da pirataria — aquela época em que camelôs dominavam as ruas, vendendo pilhas e mais pilhas de CDs e DVDs piratas por 5 reais — surge, aqui mesmo no Brasil, uma invenção que prometia ser a salvação da indústria da música.
A proposta era simples e ousada: um CD barato, acessível, legalizado, que poderia bater de frente com os piratas. Uma ideia tão maluca que, se tivesse dado certo, poderia ter mudado completamente o jogo.
Volta no tempo comigo. O cenário era caótico. A pirataria simplesmente devorava a indústria fonográfica.
Em 2005, só pra você ter uma ideia do tamanho do problema, a polícia brasileira apreendeu nada menos que 33 milhões de CDs e DVDs piratas. Trinta e três milhões. Isso é quase o dobro do que foi apreendido no ano anterior. O estrago era imenso. Metade, ou até mais, de todo o mercado de música no Brasil estava nas mãos da pirataria. Estimava-se na época que entre 48% e 65% de tudo que se consumia em música vinha de cópias ilegais. E não era difícil entender por quê. Enquanto um CD original, nas grandes lojas, custava seus 8, 9 reais — e olha que esse era o preço barato — na rua, na banca do camelô, você levava qualquer álbum por 4 reais. Era barato, era fácil, era tentador. E, pra muita gente, era o único jeito de consumir música.
E é aí que entra o personagem mais improvável dessa história. Ralf. Sim, aquele mesmo, da dupla sertaneja Chrystian & Ralf. O cara olhou pra aquele cenário de destruição da indústria e pensou: não dá pra lutar contra a pirataria. Então bora jogar o mesmo jogo. Só que legal. E, pasmem, ele não ficou só no papo. Ralf virou quase um cientista nas horas vagas. Foi atrás, pesquisou, desenvolveu e, pasmem de novo, registrou uma patente no Instituto Nacional da Propriedade Industrial, o famoso INPI. E assim nasceu o SMD — Semi Metalic Disc. Um CD que usava menos metal na sua composição, o que barateava absurdamente o custo de fabricação. E o plano era muito claro: se o pirata custa 4 reais, eu faço um CD legal, de qualidade, por 5 reais.
O custo de produção era coisa de outro mundo. Enquanto um CD normal saía por uns 3 ou 4 reais pra ser fabricado, o SMD custava míseros 1 real e 40 centavos. Isso mesmo. E na ponta, pro consumidor, ele chegava por 5 reais.
Com esse preço, dava pra bater de frente com qualquer pirataria na época. Só que a visão do Ralf ia além. Ele não queria só vender barato. Ele queria, literalmente, transformar os camelôs, os vendedores ambulantes — que até então eram os vilões do mercado — em aliados.
A proposta era: esses caras que já tão na rua vendendo pirata, eles podem vender o SMD. Só que de forma legal, ganhando dinheiro, pagando os direitos, remunerando o artista. Todo mundo ganhava. O ambulante ganhava, o artista ganhava, a indústria ganhava e o público também.
Era uma ideia absolutamente genial. E, honestamente, muito corajosa. Afinal, qual gravadora na época teve peito de pensar fora da caixa desse jeito? Nenhuma. Só que, como tudo que nasce no olho do furacão, a coisa não é tão simples. O grande problema do SMD não era a ideia em si. Era o mundo. O mundo já tinha mudado. E mudado muito rápido. Enquanto o Ralf tentava resolver o problema da pirataria física, a galera já tinha migrado pra internet. Era a era do Napster, do eMule, do Kazaa, do LimeWire. Era a época dos MP3. As músicas não estavam mais só na banca do camelô. Elas estavam no computador de todo mundo. E sabe quanto custava baixar um álbum inteiro na internet? Nada. Zero. De graça. De forma ilimitada. E sem nem precisar sair de casa.
E pra piorar, as vendas de CDs no mundo inteiro simplesmente desabaram. É chocante olhar os números. Entre 1999 e 2015, o mercado global de música física encolheu mais de 44%. E as vendas de CDs, especificamente, despencaram 74%. É isso mesmo que você ouviu. Três quartos do mercado foram pro espaço. No Brasil, claro, a história foi igualzinha. A galera simplesmente parou de comprar CD. Não importava mais se era original, pirata ou SMD. O modelo tinha quebrado.
E como se não bastasse, nenhuma grande gravadora no Brasil quis embarcar nessa ideia. Nem Warner, nem Sony, nem Universal, nem Som Livre, ninguém. A indústria olhou pro SMD, achou interessante, mas não apostou. Talvez porque, no fundo, todo mundo já sabia que o CD tava morrendo. E não fazia sentido investir num formato novo, por mais genial que fosse, num mercado que já tava derretendo.
E o que sobrou foi isso: uma ideia incrível, nascida no Brasil, criada por um cantor sertanejo que virou inventor, uma tentativa honesta de salvar a música, mas que nasceu no tempo errado. Enquanto o SMD tentava resolver o problema da pirataria física, o mundo já tava pulando de cabeça no digital. A guerra já não era mais contra o CD pirata da esquina. A guerra era contra o próprio conceito de possuir música.